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O Direito Marítimo no novo Código Comercial

Marcelo Sammarco

O Direito Marítimo é um ramo do direito autônomo e independente que rege as relações decorrentes das atividades inerentes à exploração do transporte marítimo de cargas e passageiros. A sua autonomia e independência é defendida por inúmeros e renomados maritimistas pelo fato de possuir fontes, conceitos e leis próprias e, também, por ser regulado de acordo com os usos e costumes e pelas práticas internacionais que norteiam o comércio marítimo (Lex Mercatoria). Além disso, possui caráter multidisciplinar, pois interage com as mais diversas áreas do direito, cabendo destacar o direito constitucional, comercial, civil, ambiental, internacional público e privado, tributário, trabalhista, entre outros.

No Brasil, o direito marítimo é regido de acordo com a segunda parte do Código Comercial de 1850 (ainda em vigor) e pela legislação esparsa (leis ordinárias e decretos), bem como através de tratados e convenções internacionais.

Atualmente, está em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei 1572/2011, de autoria do Deputado Federal Vicente Cândido, que propõe criar um novo Código Comercial, revogando expressamente a segunda parte do Código Comercial de 1850, que trata justamente do comércio marítimo de cargas. Todavia, o texto original do PL 1572/2011 não contém nenhum dispositivo específico sobre as relações decorrentes do comércio marítimo, o que deu origem a elaboração de emendas, a fim de preencher a lacuna na lei que resultaria da revogação Código de 1850. Foi, então, criada uma comissão de juristas com o propósito específico de elaborar uma emenda ao PL 1572/2011, que propõe incluir o Livro “Do Direito Comercial Marítimo” no texto do novo Código Comercial. Essa comissão foi constituída no âmbito da Associação Brasileira de Direito Marítimo – ABDM e, além de alguns de seus membros associados, está também integrada por Juízes do Tribunal Marítimo e advogados maritimistas, sob a coordenação do Prof. Fabio Ulhoa Coelho. Ao final dos trabalhos, a comissão elaborou um texto com 10 títulos e 262 artigos totalmente dedicados ao Direito Comercial Marítimo, que resultaram nas Emendas 55 e 56 ao PL 1572/2011, ambas apresentadas no Congresso Nacional pelo Deputado Federal Eduardo Cunha.

Os textos das Emendas 55 e 56 foram elaborados com base na legislação esparsa que regula as relações decorrentes do comércio e transporte marítimo de cargas, como o Decreto-Lei 116/67, a Lei 9.611/98 e o Decreto 1.102 de 1903, por exemplo. Além disso, os dispositivos destas emendas foram criados com estrita observância aos usos e costumes do comércio e transporte marítimo local e internacional, tendo considerado, também, a jurisprudência formada na Justiça Brasileira sobre as questões inerentes ao direito marítimo, ao longo dos anos.

Um dos pontos que tem gerado polêmica por parte de alguns setores diz respeito à limitação de responsabilidade do transportador marítimo nas hipóteses de danos e/ou extravio de carga, prevista no texto da Emenda 56. Na prática, a limitação de responsabilidade só se aplicará nas hipóteses em que o contratante do transporte optar por não declarar o valor da carga no BL para pagar um frete menor. A explicação é a seguinte: o transportador é responsável pela carga recebida a bordo para o transporte, de modo que o seu risco corresponde ao valor da carga. Assim, em princípio, o transportador deveria calcular o frete sobre o valor da carga (frete ‘ad valorem’), de modo a compensar o risco para a realização do transporte. No entanto, se o contratante do transporte optar por não declarar o valor da carga, com a consequente limitação da responsabilidade do transportador, que implica na redução do risco, o resultado é um frete de menor valor. Nestas situações, o usuário contrata um frete de baixo custo (frete ‘standard’)e, em contrapartida, o transportador terá a sua responsabilidade (risco) limitada na forma da lei ou do BL. Portanto, trata-se de uma opção do contratante do transporte, que sempre terá a prerrogativa de declarar o valor da carga no BL, pagando o frete proporcional ao valor do bem transportado, hipótese esta em que o transportador responderá pelo valor integral da carga, nos termos do que já dispõe o artigo 750 do Código Civil. Este tipo de limitação de responsabilidade já encontra previsão no ordenamento jurídico brasileiro há muitos anos, cabendo destacar a Lei 11.442 de 2007 (transporte rodoviário), Decreto 5.910 de 2006 (transporte aéreo) e o Decreto 1832 de 1996 (transporte ferroviário), entre outros inúmeros regramentos do gênero. Em particular, cabe mencionar a Lei 9.611 de 1998, regula o transporte multimodal de cargas, abrangendo o modal marítimo. Nesse passo, a limitação estabelecida na Emenda 56 não é uma inovação e não confere nenhum privilégio ao armador. Dessa forma, pode-se dizer que a grande vantagem proporcionada pelo texto da nova lei é atualizar a regulamentação do setor e consolidar a legislação afeta às questões marítimas, facilitando aplicação da lei por parte dos operadores do direito.

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